O autor da frase“o freguês tem sempre razão”nem sabia, mas estava disparando uma profecia. Muito antes de o mundo ouvir falar no termo “cool hunting”(algo como “caçada ao descolado”), es- se dito popular já sacramentava o poder do consumidor de fazer prosperar —ou minguar —uma marca, produto ou serviço.
Observar como se comporta o consumidor, saber ouvir o que ele tem para dizer, sempre foi im- portante. Hoje, em um mundo cada vez mais competitivo, é uma questão de sobrevivência. E mais: o que antes podia ser desvenda- do no contato direto com o clien- te, hoje consome meses de pesquisa em âmbito global.
O que ocorre fora do país, um dia chega até aqui. E vice-versa. Hoje se vive em meio a um universo de tendências de con- sumo em constante movimento. E para torná-lo menos nebuloso, a empresa de pesquisa global Trendwatching, com filiais em várias partes do mundo, inclusive em São Paulo, criou o relatório “Expert em Tendências –Ver - são Ninja”. O subtítulo do estudo explica a que ele se destina: “Tudo que você precisa para persuadir colegas de trabalho e clientes sobre o poder das tendências de consumo”. Já no início, o texto ajuda a desmistificar: tendência não é moda, mas algo que define um caminho em meio a um bombardeio de informações.
Dominando o seu traçado, é possível ganhar agilidade sem perder o foco. “Tendências ajudam a encontrar o ‘insight ’, gerar ideias certeiras, e então executá-las do jeito correto. O resultado? Consumidores encantados”. Encantados e cheios de razões em suas escolhas ou recusas — que, por sua vez, são resultado de uma nova manifestação dos desejos do ser humano. Tendên- cia de consumo — esse termo desgastado pelo uso indiscriminado — nada mais é do que comportamento. Ele expressa uma nova atitude, que pode fa- zer de um cliente com hábitos previsíveis, um poço de mistério. Os sinais estão por toda parte. É preciso, no entanto, saber co- mo encontrá-los. Um dos cami- nhos é questionar-se constante- mente sobreas necessidadesdos consumidores, diz o especialista em inteligência de mercado, branding epesquisa, JotaErre — autor do livro “E s t r a m b ó l i c o” (Estação das Letras e Cores). “A ausência de questões que bus- quem entender os consumido- res pode revelar uma empresa míope ou mesmo um gestor que não enxerga valor no que pro- duz”. Negócios assim, diz Jota Erre, tendem a desaparecer. A competitividade de hoje exige dedicação ao cliente, diz o especialista. “A experiência de compra deve estar aliada ao po- der de engajamento da marca, em todo o ciclo de vida de con- s u m o”, afirma Jota Erre. “To d o s os pontos de contato com o cliente são oportunidade de aprendizado, mesmo os conta- tos secundários, como ‘posts’ e ‘likes’em redes sociais”.
Com um formato que mistura crônicas, depoimentos, observações do próprio autor e dados de mercado, o livro “Estrambólico” traça um panorama das tendências que estão mobilizando —ou deverão mobilizarem breve — os consumidores daqui e de lá. “No Brasil, o uso de estu- dos de comportamento é raro, especialmente nas pequenas e médias empresas”,diz Jota Erre.
“O tema ganha atenção nos processos de planejamento Estratégico, mas costuma ser superado pelas projeções econômicas”. A razão, diz o especialista, é a capacidade delas de traduzir algo mais concreto. “Mas estamos num processo de transição, com os profissionais da área de estudo de tendências ganhando mais atenção”. Enxergar tendências não tem nada a ver com adivinhação, mas com observação combinada a pesquisa, em um planejamento estratégico de médio e longo prazo.O maiscomum, noentan- to é só se dar conta das inova- ções quando elas já foram dis- seminadas. Reagir em cima da hora significa perder oportuni- dades. “Apostar numa tendên- cia é direcionar esforços para o desenvolvimento de produtos,
canal, linguagem e até preço”, afirma Jota Erre. E tudo isso deve ser feito de maneira alinhada com os objetivos estratégicos e valores da organização. Ou seja: não há cartilha pronta que sirva para qualquer em- presa. “Investir numa tendência requer muito trabalho e pouca i n t u i ç ã o”, diz o autor de “Es - t r a m b ó l i c o”. A intuição funciona para relacionamento entre pessoas. Segundo Jota Erre, nos negócios, dados e informação ainda são os maiores aliados. Como prever, por exemplo, que um aplicativo que nada mais é do que um correio senti- mental de esfera virtual —como o Tinder —pudesse se tornar um fenômeno? Observando a tendência que começava a surgir, mostrando o desejo de trazer para o real a conexão instantânea e o reconhecimento social que o universo on-line permite.
O resultado veio da observação, não de poderes paranormais. “O Tinder é apenas um exemplo de sucesso de uma tendência”,diz o estudo da Trendwatching. Vale dizer que o serviço, em si, é um modismo, cuja durabilidade é difícil de prever. Mas isso não é importante, segundo aponta a Trendwatching. “As tendências não têm a ver com o sucesso ou desastre de inova- ções individuais”. E o desejo do consumidor por comunicação instantânea e reconhecimento social irá continuar? Na visão dos pesquisadores da empresa, sim. “E certamente haverá novas oportunidades para servir a esse desejo”.(VB)